Durante a vigência do PSI (Programa de Sustentação do Investimento), de 2009 a 2014, 134 milionários privilegiados compraram aviões da Embraer por meio do BNDES (banco com recursos públicos), pagando juros muito baixos (entre 4% e 7% ao ano).
Em lugar de educação, saúde, segurança e infraestrutura, a prioridade (na repartição da pizza do orçamento) é a satisfação dos desejos (incluindo os consumistas) da classe mais abastada.
O Brasil não chegou onde chegou por obra de uma divindade. O Brasil não é um país subdesenvolvido por acaso (Darcy Ribeiro). O Brasil cresceu sem nenhum senso de pertencimento da população. Poucos ou ninguém quer saber de suas obrigações individuais ou coletivas. Todos querem seus direitos, ou seja, seu gozo em primeiro lugar.
É precisamente nessas economias equivocadas que surgem sem dificuldades programas como o PSI, de retorno duvidoso ou claramente prejudicial, posto que destinam parte dos recursos coletivos escassos para quem tem acesso às decisões do governo.
O programa nasceu em 2009, com uma Medida Provisória da era Lula, que junto com Clinton, Tony Blair e tantos outros líderes da economia mundial, praticou o chamado neoliberalismo progressista, conforme acertada observação de Nancy Fraser. Tudo para o 0,1%, reafirmando-se, no entanto, o discurso inclusivo de várias minorias (negros, índios, trabalhadores, LGBT etc.).
O programa veio como um “incentivo à economia”. Segundo o BNDES, foram financiadas 134 aeronaves da Embraer, no valor total emprestado de R$ 1,9 bilhão.
Tendo em vista que o PSI ofereceu juros abaixo da taxa básica (Selic) para a compra das aeronaves, essas operações tiveram um custo para o Tesouro. De acordo com os cálculos do BNDES, tal subsídio custou R$ 693 milhões em valores corrigidos.
Aqui está um exemplo do quanto que deturparam novamente (e por completo) o capitalismo, que se mostrou capaz de gerar certa prosperidade para milhões de pessoas. Com a Grande Depressão de 1929 o capitalismo soube se reinventar. Nos EUA nasceu o New Deal, ou seja, o governo ajudou a tirar a população e a economia do buraco.
Depois da Segunda Guerra Mundial (1945), estando o capitalismo novamente no buraco, implementou-se o Estado de Bem-Estar Social na Europa. Trinta anos depois veio o atual modelo econômico do tudo para o 0,1% (e que se f*da o resto, 99,9%).
Sua atual forma degenerada gerou sociedades muito divididas, onde preponderam as ideologias e o populismo, não o pragmatismo (que está acima das polarizações aberrantes que obscurecem os verdadeiros problemas na nação).
Uma nova casta privilegiadíssima (do capitalismo financeiro-tecnológico) leva a quase totalidade da pizza para ela, gerando desigualdades e prejuízos nefastos para os demais.
Para as castas privilegiadas (0,1%) tudo e para o resto (99,9%) a miséria, a precariedade, o desemprego, a pobreza, a queda da renda, a desindustrialização, a falência do comércio, o rebaixamento das classes médias, o achatamento salarial, o trabalho precário e mal remunerado e por aí vai.
O Brasil continua sendo um dos países mais injustos do planeta. Isso não é obra divina nem da natureza. O estrambólico modelo econômico atual (tudo para o 0,1% e que se f*da o resto) deve ser reinventado prontamente. Sua falha pode e deve ser corrigida. Qual liderança política se habilita para reinventar o mundo?
LUIZ FLÁVIO GOMES*, Professor, Jurista e Deputado Federal Contra a Corrupção.